25 de março de 2006

The Last House on The Left


Nos Estados Unidos, os anos 1970 foram representados por uma geração que parecia não possuir limites. Abuso era a palavra de ordem. Muita droga, muito sexo, muito rock n’roll. E foi neste contexto libertário que, em 1972, Wes Craven concebeu o violentíssimo The Last House on The Left. E parece distante a época em que um diretor que se transformou no ícone do terror adolescente caça-níqueis mostrou indiscutível talento ao retratar a violência com tanta veracidade.
Na produção, a perversidade segue sua trajetória torta. Os marginais não possuem nenhuma motivação para serem tão cruéis. Não são excluídos sociais, não sofreram traumas de infância, não têm, enfim, nenhuma explicação que sirva como jutificativa para seua atos. Eles, entretanto, não hesitam em expor a pior face do ser humano. E isso vale para todos. O troco das pessoas comuns é planejado de forma tão mirabolante que soa desequilibrado em seu excesso de violência.

O filme é extremamente meticuloso e corajoso em abordar a violência com propriedade e de maneira tão visceral. Entretanto, não é esse excesso gráfico o melhor da produção. O melhor está em compartilhar do abuso desmedido a duas belas garotas ao som de uma bem trabalhada música folk, que pontua magistralmente o impacto das imagens. A fotografia cuidadosamente amadora remetendo ao tom documental, imprescindível ao contexto da obra. O espectador fica maravilhado (e até certo ponto, culpado) diante dos excessos do espetáculo de crueldade. Um espetáculo inacreditavelmente sórdido, mas construído de forma absolutamente autêntica.

Inspirado em A Fonte da Donzela de Ingmar Bergman,o roteiro escrito por Craven centra-se na aniversariante Mari Coollingwood (Sandra Cassel) e sua amiga Phyllis Stone (Lucy Grantham). Duas belas garotas submetidas a todo tipo de barbáries nas mãos de bandidos hedonistas. Elas são cúmplices em confidências bobas e Craven chega a sugerir que Phyllis tenha um carinho mais que especial pela amiga. Affair consumado da pior maneira possível a posteriori. Mari está fazendo 17 anos e parece encantada com as possibilidades abertas pela amiga descolada.
As duas vão à cidade a fim de assistir a um show de uma banda de rock – a “famosa” Bloodlust. Depois de um inocente sorvete, a idéia de um pouco de maconha. Um sujeito diz que tem erva e as convence a subir ao seu apartamento para pegar a droga. Pronto, elas caem na armadilha e agora estão a mercê da gang barra pesada de Krug Stillo (David Hess). O resto da turma é formado pelo filho ilegítimo de Krug, Junior Stillo (Mark Sheffler), o escroto Fred “Weasel” Podowiski (Fred Lincoln) e a vamp imbecil Sadie (Jeramie Rain). Só gente boa!

Eles vão humilhar as garotas pelo simples prazer de vê-las sofrer. O abuso violento de Phyllis ainda no apartamento é o pontapé inicial no círculo de horrores. Na manhã seguinte, a turma parte com as duas no porta-malas do Caddilac conversível 1958. Quando o carro quebra, eles se embrenham com as meninas por uma floresta à beira da estrada. O clímax da barbárie. Krug obriga Phyllis a fazer xixi nas calças (“piss your pants”), faz elas baterem uma na outra, e força uma relação entre as duas. Com a ausência momentânea do chefe do bando, a tentativa desesperada de fuga. O erro fatal, a morte cruel de Phyllis a punhaladas e o estupro e execução de Marie. Sangue, muito sangue. Imagens que ficam impregnadas na retina.

Neste meio tempo, papai e mamãe Colingwood personificam a felicidade irritante nos preparativos para a festa de aniversário da filha. Com a demora de Mari, Dr. John (Gaylord St. James) e Estelle (Cynthia Carr) contatam a polícia. Enquanto os vilões são estereótipos de maldade, os policiais são da imbecilidade. O xerife (Marshall Anker) e o policial Harry (Martin Kove) fazem tudo errado chegando ao cúmulo com a negociação de uma carona. As pitadas de humor, definitivamente, não se enquadram no contexto da obra.

Por fim, os marginais vão buscar abrigo na última casa à esquerda. São bem recebidos pelos Collingwood. Por fim, a vingança dos pais ao descobrirem que estão dando abrigo aos algozes da filha. Famosa castração durante o sexo oral e um dos suicídios mais fortes do cinema setentista. O “blow your brains out” não sai da cabeça. Arrepiante! Armadilhas espalhadas pela casa também parecem coisa de menino travesso e não poderiam entrar em um dos mais sádicos rape e revenge da história. Mas se encaixam sim - tudo é violento demais, obedecendo à proposta deliciosamente absurda.

O filme foi produzido pelo idealizador da série Sexta-Feira 13, o espertalhão Sean S. Cunningham e tem outro adepto da “franquia” como assistente de produção, Steve Miner. Entretanto, Last House é parente mais próximo de outro marco da época: O Massacre da Serra Elétrica. Como no filme de Hopper, há uma mensagem que diz que os fatos apresentados pelo filme são verdadeiros. Entretanto, apesar das semelhanças ainda passarem pelo enquadramento sujo e pela imagem remetendo a uma velha Super 8, Last House é mais explícito e visceral que seu sucessor. O filme de Craven é a melhor representação de uma geração que parecia perdida em seus próprios excessos. Impossível não sair cantarolando The Road Leads to Nowhere (autoria de David Hess) cheio de culpa e ao mesmo tempo maravilhado por ter presenciado tanta brutalidade revestida em autenticidade.

Ponto Alto: David Hess está espetacular. Brutal, irônico e violento. A legítima personificação do mal. Destaque é a breve reflexão após o estupro de Mari.
Ponto Baixo: há uma série de coincidências e situações que são um atentado ao bom senso. Havia um objetivo a ser cumprido e, em vários momentos, a lógica acabou em segundo plano. Faltou um acabamento melhor no roteiro.

7 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Ui...
Não dou conta desse filme não...
Beijos.

7:16 PM  
Anonymous Anônimo said...

Ótimo texto!! Faz tempo que não revejo esse filme, realmente foi um choque na época de seu lançamento. Aliás, o cinema americano da década de 70 foi uma espécie de reflexo das transformações pelas quais aquele país passava em termos socioculturais. Personagens neuróticos, perdidos, a ponto de explodir. UM DIA DE CÃO é uma das maiores pérolas dessa época. Ótimo teu blogue. Abraço.

8:45 PM  
Blogger Juarez Junior said...

Olá Grazi. É um filme forte mesmo, mas vale a pena. Feche os olhos em alguns momentos e abaixe o volume em outros. hehehe

Grande Fernando, concordo contigo em gênero, número e grau nesta questão do cinema americano setentista. Os filmes produzidos na época são os meus favotitos. Os conceitos ainda não estavam totalmente formados... Então valia muita coisa, hoje a motivação é outra. Cada época tem sua importância, mas prefiro os anos 70. Os personagens continuam insuperáveis.

1:26 PM  
Blogger Unknown said...

Interessante seu blog, os textos são bem completos, apesar de que eu não vi a maioria dos filmes de que você fala aqui. O único que eu cheguei a assistir foi Pixote, tem tempo, eu era muito mais novo, cheguei a ficar perturbado com algumas coisas do filme na época.

5:32 PM  
Blogger Unknown said...

Já tá linkado no meu blog também.
Cara, não notei nenhum problema da outra vez não, se bem que eu não tentei olhar os outros posts, li somente os que estavam na página principal mesmo.

12:47 AM  
Anonymous Anônimo said...

Excelente texto!! Nunca vi esse filme de Craven, e olha q. eu curto inclusive a série "Pânico" - hehehe -, mas já tinha ouvido falar bastante, no entanto, esse texto foi estimulante, o problema agora vai ser descobrir como acessar o filme.

E curioso, um personagem chama Krug e outro Fred, dá o q. pensar.

Dos q. vi, inclusive "The Hill have eyes", meu preferido é o filme do Haiti: "A Maldição dos Mortos-Vivos", se bem, q. o 1.º Nightmare é um achado na idéia de explorar o sonho como fonte do perigo, algo realmente muito incomodo.

11:50 AM  
Blogger Juarez Junior said...

Valeu Wilson. O blog tava com uns probleminhas, fui mexer na estrtura da página e acabei fazendo algumas besteiras. Vou melhorando aos poucos.

Grande Eduardo... Sou fã do Craven e gosto de Pânico também. Acho a idéia do primeiro Pânico original e além disso, o filme é acima de tudo muito divertido. Compartilho extamaente da sua opinião sobre Hora do Pesadelo (comentei outro dia com um amigo que a premissa de atacar no refúgio que é o sono é mesmo genial... os personagens não têm escapatória).
Entretanto, os meus preferidos do cara são mesmo Last House e Quadrilha de Sádicos. Anos 70, essas coisas hehehe
O Maldição dos Mortos Vivos é um de macumba que tem o Bill Pullman novinho, né?! Vi faz tempo e não lembro de quase nada, mas agora com seu aval, vou rever o mais rápido possível.
Abração!

9:44 PM  

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