19 de abril de 2011

Teorema


Os filmes de Pasolini são cheios de alegorias que, mesmo cheios de voltas e piruetas, sempre remetem sempre a insatisfação com a ordem vigente e a exploração da classe trabalhadora por uma burguesia sem princípios. O cara era comunista de carteirinha e manifestava de forma muito direta sua ideologia, mas sempre de forma surpreendente e reveladora, afinal era um cineasta, no mínimo, inventivo pra ficar em um adjetivo comum. Foi assim em Saló de forma explícita e escatológica, já em Teorema a crítica é mais sutil em sua apresentação, nem tão pouco menos agressiva.


Um visitante, que pode ser interpretado com um anjo ou redentor (Terence Stamp), hospeda-se na casa de um rico industrial de Milão, vivido por Massimo Girotti. Esse elemento estranho e sublime destrói a suposta harmonia familiar ao se envolver sexualmente com todos os membros da família expondo uma realidade cheia de segredos e moldada apenas pela aparência e individualidade. Stamp usa todo o charme de tempos idos pra jogar merda em uma elite que adora apontar o dedo na cara de todos apenas por ter dinheiro e, consequentemente, poder. Entretanto, na realidade, são bem mais frágeis e miseráveis que aqueles que exploram. Tenho algumas reservas quanto a determinadas escolhas artísticas de Pasolini, mas ninguém pode chamá-lo de incoerente quando o assunto é sua postura política.


Destaque para o envolvimento do hóspede com a empregada da família, vivida por Laura Betti. E aí, Pasolini que era ateu, mas, reza a lenda, amigo do Papa João XXIII, trata de outro de seus temas recorrentes – a religiosidade, mas precisamente o catolicismo. Quando o tal hóspede vai embora, a empregada acaba por voltar para sua humilde Vila e, em profundo abalo emocional, passa a se alimentar apenas de ervas daninhas e vira uma espécie de Santa no local ao fazer milagres e levitar. Alegorias mil, mas além do questionamento sobre uma suposta frivolidade dos santos católicos, o cineasta exalta a importância da pureza da religiosidade na construção de uma identidade e de um sentido de comunidade. Algo que o personagem de Stamp fez aflorar de forma autêntica, mas absolutamente desconcertante e egoísta na família de Paolo. A família rica não soube lidar com uma algo tão sublime e acabou por enlouquecer, cada um a seu jeito.


Ponto Alto: Esteticamente o filme é belíssimo, culpa de Giuseppe Ruzzolini na fotografia e do mestre Ernio Morricone na música.


Ponto Baixo: O filho da família, graças principalmente a interpretação fraquíssima do desconhecido Andrés José Cruz Soublette, não está, decididamente, no nível do filme.