28 de abril de 2006

Alerta – Brasília 18%


Vou interromper a manutençao habitual do blog para um alerta. Nunca vejam esse Brasília 18%! Os comentários a seguir não pretendem atingir ninguém, apenas zombar de um projeto artístico mal intecionado e pessimamente realizado. Vamos aos fatos.
Esse é o PIOR filme brasileiro que já tive o desprazer de ver na minha vida. Constrangedor de tão ruim. Para começo de conversa, como cidadão brasiliense me senti revoltado com tamanho despautério no retrato simplório da minha cidade. Fotografia marrom mostrando a seca no inverno e trama nos bastidores sujos da política. Nossa, que original! Nos letreiros de abertura aparece o nome de Bruna Lombardi com a seguinte destinação: Participação Afetiva. Realmente não é para ser levado a sério.
Quase saio no meio da sessão com aquela prostituta paulistana expressiva pra caramba em um debate na porta de um quarto de hotel com nosso amado protagonista Carlos Alberto Riccelli. O cara só atua com os olhos. É um gênio.....Acho que passei a ver o cinema de modo diferente depois de Brasília 18%. Passei a ver como uma grande farsa!
No menu, ainda uma infinidade de erros de continuidade que até um cego consegue vislumbrar e personagens com nomes representativos da nossa cultura. Verdade isso... O protagonista se chama Olavo Bilac e é um médico legista. Tem uma lenda urbana maldosa que diz que o poeta (o original, claro!) era necrófilo. Não sei se foi proposital, mas, junto com Sinfonia de Brasília, essa ironia foi a única razão que me fez agüentar a tortura até o fim.
Não consigo entender a participação de Carlos Vereza e Othon Bastos em um projeto deste. E Bete Mendes?! Como um ícone da nossa filmografia, como Nelson Pereira dos Santos, pôde cometer um atentado desses? Estou chocado, por trás de tanta sarcasmo há muita revolta em relação aos desdobramentos do cinema nacional.
Desculpe a revolta, mas quando Evandro Mesquita inventa um sotaque a lágrima quase caiu! E o roteiro disso? Piada, só pode ser! .
Quanto a vocês meus amigos: FUJAM! FUJAM!
Detalhe – a cena da CPI com a participação do parlamentar Machado de Assis faz qualquer ser humano corar de vergonha.

23 de abril de 2006

Emanuelle in America


Quem nunca ouviu falar da musa erótica do cinema europeu, a querida Laura Gemser? Nascida na ilha de Java em 1950 e dona de traços delicados e de uma morenice perfeita, a moça foi um dos maiores expoentes do cinema feito na Europa nos anos 1970. Gemser não se fazia de rogada em exibir o corpo magérrimo em tórridas cenas eróticas, o quê até lhe rendeu o coração de um dos galãs mais cobiçados (e baratos) do cinema italiano na época, Gabriele Tinti. Neste período de ouro, a parceria mais sólida foi com o talentoso malucão Aristide Massaccesi, para os íntimos Joe D’Amato. Muita coisa ruim, como uma versão baraterríma da história de Calígula e outros filmecos, mas também coisa interessante como os exemplares da série Black Emanuelle.

A trajetória de Gemser com a personagem começou com Emanuelle Negra de Bitto Albertini em 1975. Porém, o que deu notoriedade a modelo javanesa foi sua participação em Emanuelle 2, continuação do original e protagonizado por Sylvia Kristel. Só para refrescar a memória, Emanuelle apareceu pela primeira vez no cinema sob a batuta do francês Justin Jaeckin. Baseado nos escritos (autobiográficos?) de Emmanuelle Arsan, o filme contava a estória de uma jovem modelo casada com um diplomata descobrindo o sexo na sugestiva Bangkok. Emanuelle foi um estouro na Europa; na França passou um ano e meio em cartaz. Daí, toda a celeuma em cima da personagem, que, logicamente, foi aproveitada pela turma do explotation. A galera underground chamou uma figurante de destaque na continuação do original para o papel principal e assim foi concebida Black Emanuelle. Joe D’Amato, por sua vez, pegou a série em 1976 com Emanuelle in Bangkok. A personagem andou em mão menos habilidosas, até encontrar a razão de ser com o polêmico e visceral Emanuelle in America, finalizado por D’Amato em 1977. O resto da história é triste, pois vieram aberrações como Emmannuelle e todos conhecemos aquela versão no espaço das sessões de sábado à noite da Band. Lamentável.

Mas voltemos aos anos 70 para falarmos de coisas boas. Estiloso até a última ponta do cabelo laqueado, com violência e sexo em doses cavalares, Emanuelle in America conta as aventuras de uma corajosa fotógrafa atrás de uma turma que andava exagerando na busca do prazer. A denúncia é que um grupo de ricaços formou uma rede para patrocinar snuffs movies. A repórter vai usar de todos os recursos para desvendar esta história. Logo no início da trama, um puritano tenta intimidar nossa heroína. Nada que um belo sexo oral não resolva. No começo das investigações, ela vai trabalhar na mansão do poderoso magnata Eric van Darren (Lars Bloch, idêntico ao Woody Harrelson). As armas da nossa jornalista na empreitada são a sensualidade e uma mini-câmera em um bracelete. Começa a brincadeira, banho com as meninas, sexo lésbico com espanhola carente e garota praticando zoofilia com cavalo.

Emanuelle então é convocada para dar uma força para um casal que anda tendo problemas na cama lá em Veneza. A bicha é tão ordinária que dá mole até para o gondoleiro. O casal a quem a repórter vai prestar solidariedade é formado pelo Duque Alfredo Elvize (Gabriele Tinti, o senhor Gemser) e sua bela esposa Laura (Paola Senatore). Ela instiga os dois, mas se retira no clímax da coisa. Ainda em Veneza, numa festa-orgia, as primeiras insinuações de sexo explícito. Ela volta à Nova Iorque, infiltra-se em um clube em que a mulherada comanda o espetáculo; neste lugar, os homens são tão submissos que usam coleiras. Chegou a hora da insinuação dá lugar ao explícito, com direito a transa em cabana na praia, ménage à trois e sexo com bigodudo fantasiado de zorro. Reza a lenda que a inserção de cenas de sexo explícito foi idéia de um produtor francês. Eu, particularmente, acharia melhor deixar a coisa apenas na sugestão. Gemser não participa de nenhuma dessas cenas.

Depois de ver uma fita ainda neste clube, Emanuelle chega a um senador em Washington por indicação do seu editor. Após um bom rala-e-rola, tem acesso a uma fita snuff. Ela, então, é drogada e levada a uma ilhota latina. Acaba presenciando, totalmente dopada, a tortura de mulheres por um bando de sádicos militares em roupas verde-oliva. Essas cenas são de uma brutalidade de fazer corar mesmo quem está acostumado a este tipo de produção. As seqüências foram filmadas em 35 mm e depois passadas para 8mm, dando aquele tom documental impressionante. Acusou-se D’Amato de fazer um suff de verdade, tal a precisão dessas imagens com direito a estocadas na vagina e seios sendo cortados com faca. Mas as dúvidas se diluem tão logo descobrimos que o maquiador preferido de Lucio Fulci, Gianetto de Rossi, estava por trás da empreitada. Mais uma curiosidade; por conta dessas cenas, nosso querido diretor teve o passaporte cassado e ficou cinco anos sem poder sair do território italiano. A atriz que teve o seio cortado disse que ficou traumatizada etc. Barra pesadíssima!

Enfim, Emanuelle in America escancara suas restrições orçamentárias, mas é um achado em sua realização. Obra de um verdadeiro mestre. A música disco NUNCA foi usada com tanta propriedade. Meio disco, meio brega, totalmente cool. No sentido de criar o clima da época, a obra é um caso singular. De resto, tudo é muito divertido e agrada em cheio ao público acostumado a este tipo de espetáculo. Tem gente que reclama do cast feminino. Besteira, as mulheres são bonitas e as críticas vem apenas de quem não está acostumado à nudez pré-silicone. Nesta linha, o filme é insaciável. O erotismo não pára e sempre há um corpo nu em cena. Joe D’Amato, atrevo-me a dizer, entregou a sua obra erótica definitiva, mesmo que depois tenha se enveredado para o pornô propriamente dito. Ele mesmo dizia que o hardcore é o fim do erotismo. Não perca Emanuelle in America por nada, pois este é definitivamente um clássico. Diga-me em que filme o namorado da protagonista tem na sala um quadro de uma melancia cortada em forma de vagina? E que tal uma mesa de centro da Marlboro. Detalhe, a mesa abre para dar acesso ao bom e velho Red Label. Bom demais!

Ponto Alto: uma cena em particular merece aplausos. Emanuelle e duas amigas se embrenham na piscina ao som de uma deliciosa música extremamente datada. A câmera submarina registra tudo. Retrato da geração do amor livre.

Ponto Baixo: o casamento em um paraíso tropical que encerra o filme.

14 de abril de 2006

Thriller – a Cruel Picture


O sueco Bo Arne Vibenius tem uma biografia singular na história do cinema. Primeiramente, foi colaborador do homem máximo do cinema sueco, Ingmar Berman. Depois desse período de louros, em 1974 se entregou a uma obra explotation que mudou sua vida para ao bem e para o mal. Câmeras inovadoras, cenas de sexo explícito, violência grosseira, uma trama absurda e figurinos pra lá de estilosos. Assim é Thriller – a Cruel Picture, o filme que Tarantino denomina o maior sobre vingança (que coisa é essa?!) já realizado. A produção virou a cabeça do público underground, mas dizem que Bergman não aprovou o trabalho do pupilo e por isso nunca mais trabalhou com Vibenius. Pouco importa se a lenda é verídica, mas que valeu a pena o sacrifício isso valeu. Thriller virou referência obrigatória; da protagonista de tapa-olho e sobretudo preto às cenas de violência em câmera lenta, tudo virou cult.

Alguns aproveitamentos viraram verdadeiros símbolos do cinema contemporâneo. O estilo de women with guns (WWG), tão em alta hoje em dia, começou com o filme sueco. Violência filmada em câmera lenta, que fez a fama de John Woo, foi inovação proposta por Vibenius. Tudo bem, Sam Peckimpah também fez isso, se bem que usou mais a proposta da mesma cena por vários ângulos. Como o negócio aqui é Verbinus, vale dizer que ele utilizou câmeras emprestadas da Nasa, usadas para filmar lançamentos de foguete, no retrato da vingança sangrenta da heroína. Isso sem falar em um figurino que os irmãos Wachowski (eca!) copiaram em detalhes a posteriori, e por aí vai.

O roteiro escrito pelo próprio diretor, conta a trajetória de Madeline (a linda ninfeta Christina Lindberg), uma garota muda que vive tranqüilamente com os pais em uma vila rural. Ao perder o ônibus para a cidade aceita a carona de um malandro. O vilão Tony (o excelente Heinz Hopf), com sua barba bem feita e lábia afiada, parece saído de um filme brasileiro da boca do lixo . A primeira frase do canalha é um assombro: “Você pode me dar uma única razão para não ir à cidade comigo?”. Ele vai acabar com a vida da garota. Primeiro vai viciá-la em drogas pesadas e, depois, obrigá-la a se prostituir. No primeiro programa, uma revolta com o cliente e o cafetão rasga seu olho. A cena é famosa e foi realizada com o uso de um cadáver. Quem assistiu ao Un Chien Andalou vai fazer a óbvia ligação. Madeline agora será conhecida pela alcunha de One Eye.

Sozinha e sem qualquer alternativa, ela se vê obrigada a cair na vida. Desgraça pouca é bobagem, então os pais se suicidam com o desespero pelo sumiço da filha. Os velhinhos receberam uma carta dizendo que ela tinha ido embora por não agüentar mais morar na fazenda com as restrições impostas por eles. Tony e sua turma são escrotos mesmo. Dessa forma, Madeline parece aceitar a condição (ganha uma grana pelo trabalho), mas é armação. Madeline faz aulas de caratê, tiro e perseguição automobilística arquitetando a vingança contra seus algozes. Há até um clipe ao estilo sueco mostrando a evolução nas habilidades. Bacana demais.

Destaques para cenas de sexo explícito nas quais foram usadas dublês de corpo para Lindberg. A edição deixa isso claro. Outra lenda, Vibenius pegou garotas de programa de Estocolmo para realização dessas seqüências. Mas calma pessoal, não há motivo para desespero. A nossa querida protagonista é muito sensual e não hesita em exibir o belo corpo a todo instante.

Com o fim brutal da amiga Sally (Solveig Andersson), único consolo de Madeline naquele mundo, chega a hora da vingança. A turma malvada é eliminada com brutalidade. Tudo registrado em câmera lenta. Uma perseguição de carros e a morte engenhosa de Tony no melhor estilo western spaghetti. Destaque - a bronca pra cima de dois policiais que tentam impedir a justiceira foi plagiada (a palavra é essa) em Matrix.

A trama é particularmente absurda e parte de uma premissa que parece patente desses filmecos de ação realizados hoje em dia. O ritmo é lento e, nos experimentalismos, a realização ficou aquém do esperado. Entretanto, a julgar pela infinidade de imitações, todas as inovações são idéias, no mínimo, criativas. Ao apresentar uma protagonista inesquecível (ela não diz uma palavra durante toda a projeção) e por não se render a qualquer convenção, Thriller virou símbolo do cinema explotation. Impossível precisar se Vibenius é louco, oportunista ou gênio. Entretanto é inegável que representa a personificação ideal da expressão “uma idéia na cabeça e uma câmera na mão”.

Ponto Alto: o professor de caratê dá uma bronca na aluna que insiste em interromper as aulas para dar um pico. São momentos como esse que me fazem AMAR o cinema setentista.
Ponto Baixo: cômica perseguição automobilística com direito a explosão por toque no pára-choque.