30 de julho de 2006

Rejeitados pelo Diabo


O filme, que Rob Zombie fez como continuação de A Casa dos 1000 Corpos, é uma das mais agradáveis surpresas da nova geração pra quem gosta daquele cinema setentista ensopado de estilo. A abertura já é um prazer visual, o ataque da polícia e a violenta fuga em meio ao poeirão seco do Texas com direito a paradinha nos letreiros iniciais. Numa comparação grosseira, um Tarantino menos inteligente e mais visceral e barato. E as referências passam ainda pelo uso de dois ícones do cinema de horror dos anos 70 – Ken Foree e Michael Berryman.

A estória trata da perseguição de uma família de assassinos pelo xerifão linha dura Wydell (William Forsythe). O cara, que foi alvo de pancadas de Steven Seagal no passado, brilha e muito na pele de um xerife casca-grossa que busca vingar a morte do irmão. A cena em que defende Elvis Presley frente a um fã de Groucho Marx já virou antologia. Pelo lado dos perseguidos, Sid Haig como o feioso Capitão Spaulding e a angelical Sheri Moon naquele contraponto simples e genial entre o bem e o mal. Fechando a família, a lenda Bill Moseley, irreconhecível e dando show no papel do malucaço Otis. No elenco, ainda há espaço para gente como Geoffrey Lewis (figurinha fácil em filme oitentistas) e o latino-mor Danny Trejo na pele de um matador de aluguel. Vou parar por aqui, pois estou emocionado.

O filme é uma viagem delirante e altamente nostálgica. Parece um revival hippie repleto de cenas antológicas e muita música boa. Impossível não associar o filme a bandas sulistas dos loucos anos 1970 como Allman Brothers e Lynyrd Skynyrd. Tudo parece que deu certo nesta viagem violenta e desesperançada do talentoso Rob Zombie. Já elogiei demais, mas tanto entusiasmo não é bobeira não. Fiquei simplesmente deslumbrado, não esperava tanto. Uma obrigação para quem gosta de cinema de qualidade.

Ponto Alto: o encerramento do filme ao som da inesquecível Free Bird deixa qualquer um, mas qualquer um mesmo, arrepiado!

Ponto Baixo: a forçada para o final do nosso querido xerife Wydell foi um pouco além da conta.

24 de julho de 2006

Clube dos Cafajestes


Realizado em 1978, por um novato John Landis (um dos grandes nomes do cinema americano nos anos 80) este Animal House foi um dos pioneiros em comédias sobre estripulias na vida estudantil. Muitas piadas grosseiras e humor físico no melhor estilo pastelão, mas muito charme e uma certa irreverência inocente, o que torna difícil não rir das bobagens aprontadas pelos cafajestes. Temos ainda a presença da lenda John Belushi, que alterna momentos engraçados com tiradas bem fraquinhas, mas que pelo carisma vale a conferida no filme.

Baseado nas experiências vividas pelo roteirista Chris Miller e publicadas na revista National Lampoon, a estória é um pretexto para o desfile de aprontações em uma fraternidade universitária na Pensilvânia de 1962. Liderada pelo bonitão Eric Stratton (Tim Matheson), a comunidade Delta tem como única regra a diversão, leia-se bebedeira e mulherada. Ainda vale ressaltar que no reino dos deltas não há qualquer tipo de discriminação. Nerds e desajustados em geral são bem-vindos - olha que altruísmo!

O espectador entra na comunidade pela porta da frente na companhia de Larry Krueger (Tom Hulce, ele mesmo!) e de Kent Dorfman (Stephen Furst). Logicamente as estripulias não agradam a todos. Entra em cena o diretor Wormen (John Vernon), que se une à comunidade careta e arrogante dos ômegas - liderada pelo panacão Greg (James Daughton) - para expulsar os bagunceiros da universidade. Logicamente, a turma acaba expulsa e têm de arrumar uma maneira de voltar. Não temos aquele clipe de superação que antecede o clímax (arghhh!), uma vez que os alunos não têm que tirar boas notas ou provar algum talento para serem aceitos de volta na universidade. Eles entram pela porta dos fundos, pois fazem uma grande algazarra em um desfile comemorativo na cidade.

Com certeza, você já viu antes, mas não com tamanha originalidade. Verdade que várias piadas são um fracasso completo e que algumas das brincadeiras são de puro mau gosto, mas como diversão este Clube dos Cafajestes continua impagável! Além disso, temos a presença de Donald Sutherland como um professor riponga e Kevin Bacon no papel de um mauricinho. O filme também não se importa em ser politicamente correto, e isso hoje é importante, diante da caretice da maioria das produções feitas para o grande público! Bobo, divertido e nostálgico como uma brincadeira juvenil.

Ponto Alto: a entrada dos amigos em um bar negro.

Ponto Baixo: a musiquinha Animal House que aparece nos créditos finais é bem fraquinha!

22 de julho de 2006

O Império dos Sentidos


A lenda conta que Nagisa Oshima teve a idéia de fazer o filme depois que uma prostituta foi encontrada vagando pelas ruas de Tóquio com um pênis ensangüentado nas mãos. Dessa premissa, o cineasta realizou uma das mais conturbadas, agressivas e contundentes histórias de amor do cinema. Amor possessivo, obsessivo e hedonista, que tem na morte sua única forma de plenitude.

No filme, conhecemos, e bem, a intimidade do casal de amantes Sada (Elko Matsuda) e Kitisan (Tatsuya Fuji). Ela é apenas mais uma das criadas de Kitisan e sua esposa, mas em uma relação de servidão acaba se envolvendo com seu patrão. No decorrer do relacionamento, os papéis se invertem. No início a diversão é por conta de Kitisan e toda a submissão cabe a mulher. Entretanto, com o tempo Sada é quem passa a dar as cartas. E aí, a coisa fica séria - ela é uma espécie de ninfomaníaca com distúrbios compulsivos causados pela adoração ao amante. Um tipo bem difícil e o estilo easy go de Kitisan simplesmente oferece a inversão de valores.

Ela faz uns programas por fora para sustentar o amante, que não se percebe que aquilo também é uma forma de dominação. O cerne da trama é que Sada exige que Kitisan seja apenas seu e ele, simplesmente, aceita essa condição sem se dar conta da estranha evolução do relacionamento. O sexo é o combustível inesgotável. Várias perversões são permitidas, a constrangedora cena do ovo e o sexo com a senhora que lembra a mãe dele, entre outras. A relação evolui para o final trágico, a fotografia que encerra o filme é delirante!

O Império dos Sentidos recebeu o rótulo de pornô e outras definições vulgares, mas a verdade é que se trata de uma obra-prima do cinema japonês que lidou com conceitos até então pouco confrontados na tradicional sociedade nipônica. O homem como objeto de manipulação feminina é mesmo o maior deles, uma inversão praticamente inaceitável na cultura clássica oriental. O filme ainda trabalha com questões como o nacionalismo, a infância, a velhice, a fidelidade... Enfim, um clássico imprescindível que merece ser revisto sempre que possível.

Ponto Alto: A dama de quimono vermelho no final trágico. Inesquecível!

Ponto Baixo: Apesar de sugerir alegorias, o uso de crianças é desagradável em uma produção tão ousada!

2 de julho de 2006

She Killed in Ecstasy


Um dos meus prediletos do mestre Franco. Adoro a ambientação setentista, a mistura inusitada de experiências genéticas, intriga de assassinato e sensualidade. Esse último quesito, aliás, é o forte desse pequeno clássico do nosso querido cineasta espanhol, realizado antes da fase mais bagaceira, após a parceria com Edwin C. Dietrich. E muito da sensualidade se deve a presença marcante de Soledad Miranda. A espanhola era um assombro - traços inacreditavelmente harmônicos, acentuados por olhos escuros, uma pele morena e um corpo absolutamente perfeito. A beleza dela jamais soa agressiva, ao contrário, é sempre suave, natural. Lembra uma jovem Yoná Magalhães. Uma pena Soledad ter nos deixado ainda muito jovem, por conta de um acidente automobilístico.

Voltemos ao filme. Aqui, ela é casada com o Dr. Johnson (Fred Williams) e vive muito bem, mas o maridão, altruísta que só ele, realiza experiências genéticas com embriões visando a cura de doenças. Experiências polêmicas, tanto que é obrigado a parar por ordem do conselho de medicina. Além disso, tem o registro cassado e é exposto na comunidade médica. Não segura a onda e enlouquece, apesar da mulher fazer de tudo para dar uma força. O cara é atormentado por vozes e acaba cometendo suicídio.

A viúva passa então a usar de toda sua sensualidade para se vingar. Seduz um a um os membros do conselho, e os mata com fúria e requintes de crueldade em uma combinação inusitada de sexo e violência. Destaque para o ataque contra a Dra. Crawford (Ewa Stroemberg, outra musa de Franco). Em vários momentos, a justiceira usa uma peruca loira, sem jamais perder um pingo do charme. O final é triste.

O que diferencia She Killed in Ecstasy dos outros trabalhos de Franco é o estilo. Apesar de algumas excentricidades - como a abertura com os embriões e o sufocamento com uma almofada inflável -, o filme é bem realizado e com passagens de muito bom gosto. Produção caprichada, sem nunca deixar de lado o estilo improvisado que marcou a carreira do mestre. Além, nunca é demais repetir, de contar com o trunfo de uma Soledad bem à vontade. Vale a pena conferir!

Ponto Alto – a trilha sonora é muito bacana. Pontuada por instrumentos como cítaras, etc. Vale lembrar que Ravi Shankar estava em alta no ano de 1971. Em outros momentos, quem dá o toque é a música disco. Essa combinação tinha tudo para dar errado, mas não sob a batuta do maestro Franco.

Ponto Baixo – a canastrice de Fred Williams nos momentos de sofrimento do Dr. Johnson passa dos limites.